quinta-feira, novembro 13, 2008

Conversa ao pé do ouvido

-Alguém ajude aqui, por favor!

Uma legião de curiosos se aglomerava, mas ninguém reagia aos pedidos daquela garota.

-Ahmnnnn
-Fala comigo caralho!
-Ahmnnnn... cuff...
-Filho da puta!
-ahmnnnn... ahmnnn

-Alguém me ajuda caralho!

Ela estava de joelhos com aquele cara deitado no seu colo.
Não dava pra entender nada.
Ninguém conseguia ter uma reação.

-Borg seu merda, você não vai fazer isso. Caralho você vai foder tudo?
-Ahmnnnn
-Nãoooooo. Bando de filha da puta do caralho me ajude porra! Ele vai morrer!

Um cara de uns 25 anos se aproxima dela e pergunta o que pode fazer.
Ela grita:
- Chama uma ambulância porra!

Um casal se aglomerava ali pra ver a situação e comentam:
-Esse filho da puta ta todo fodido.
-Aposto que tava devendo, isso sim.
-Então foda-se ele. Vamos sair daqui e pegar uma cerveja.

Borg. Esse parecia ser seu nome.

-O que está... o que está... acontecendo aqui?
-Caralho seu merda. Fica comigo! Fala comigo! Olha pra mim!
-Fala mais... alto... ta tudo rodannnndo.
-Fala mais!
-Você... ta linnnda...
-Deixa de ser bobo porra! Estou horrível, gorda!
-ahmnnnnnnnn... pra onde estamos indo?
-Não estamos indo pra lugar nenhum. A gente ta no chão...
-Mas nós estamos descendo.
-Não, não estamos! Borg, o que você está falando porra!
-Parece uma... queda livre. Ta cada vez mais rápida.
-Boooorg! Seu nariz está sangrando... sua boca está sangrando. Meu Deus alguém ajude aqui!
-Que luzes são essas?
-Que luzes porra?
-Está tudo tão claro...
-Não está nada claro.
-Isso é gostoso. É tão calmo aqui...

Ela grita pela milésima vez por socorro.

Ele continua:

-Está muito frio... mas está bom... é tranquilo.

Ela chora e pede desculpas.
Ele sorri.

-O que ELES estão fazendo aqui? Eu me lembro deles...
"Eu me lembro daquele dia...
Eu não queria ir, mas eu fui. Tava sol e um pouco quente também.
Você estava comigo e nós andávamos com seu cachorro naquele parque.
Você tirava fotos enquanto o cachorro avançava nos patos que estavam na beira da lagoa.
Nós subimos numa ponte e ficávamos olhando as Carpas. Eu pedi a camêra e tirava fotos das carpas.
Tiramos fotos do por do sol e então decidimos sentar na sombra de uma grande árvore.
Eu lembro que queria que aquele momento nunca acabasse.
Eu morreria por mais um dia daqueles.
Você usava um short jeans meio desbotado e eu usava uma bermuda...
Lembro que seu cachorro corria feliz por ter aquela liberdade toda e quase se enforcava com a coleira.
Nós riamos muito de tudo aquilo.
Você vivia me pedindo pra ir ao parque com você.
Eu nunca queria ir.
Não sabia o que estava perdendo.
Era tudo tão mágico.
Queria ter ficado preso à aquele dia pro resto de nossas vidas.
Eu lembro que eu era um pouco mais forte do que hoje em dia.
Aquilo me bastava.
Ahhh aquele por de sol...
Se soubesse o jeito que isso tudo terminaria... Nunca teria valorizado aquele momento tanto quanto..."

Ela só conseguia chorar, de joelhos naquela poça de sangue onde os dois se encontravam.

-Gata... não acredito... olha quem está aqui!
-Quem? Do que você esta falando?
-Meu Deus... não pode ser.

Os olhos de Borg se encheram de lágrimas...

-Ele quer que eu vá com ele... mas eu não posso ir ainda.
-Fica Borg!!!!
-Ele está me dizendo que vai ser melhor assim.
-Não Borg! Por favor, não faz isso... fica comigo!
-Mas ele está indo embora... Não vou perder ele de vista mais uma vez... Eu vou atrás dele.
-Nãooooo... Borg fica comigo...
-Eu juro que eu já venho... Eu juro... Eu... juro... obrigado por aqueles dias...
-Por favor, não vai atrás dele!
-Eu volto... eu ju... ro...

Um rapaz se aproxima acompanhado de um policial e diz:
-Foi aquela mulher senhor. Foi ela. Eu vi tudo.

O policial pede para que ela o acompanhe.

Ela é algemada.
Ele descansa na poça de sangue com uma faca cravada nas costas.
Ela chora.
Ele sorri... de olhos fechados.
De olhos bem fechados.

Um comentário:

Anônimo disse...

Não chorei.
Jamais choraria diante de tamanha declaração de amor.Vou ali ver se ela te reconsidera e já volto.